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Governo Lula: Entidades do audiovisual expõem as expectativas para o novo mandato

Reprodução: Portal Exibidor
Em 30 de outubro o Brasil elegeu seu próximo presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito democraticamente pela terceira vez, após dois mandatos entre 2003 e 2010. Desta vez, a vitória veio na disputa pelo pleito contra o candidato à reeleição Jair Messias Bolsonaro (PL).

Para a cultura, o programa de Lula se elegeu com as propostas de reviver o Ministério da Cultura, além da criação de comitês culturais em cada estado, a retomada e ampliação de políticas públicas para o setor, melhorias na qualificação dos profissionais e a implementação do Sistema Nacional de Cultura. Entre outras propostas, o novo governo propõe a descentralização dos recursos, apoio e fomento à diversidade e investimento na produção das periferias e outras regiões menos centrais. O Portal Exibidor noticiou os programas dos dois candidatos para a área cultural.

Tendo isso em vista, depois de quatro anos em que o país enfrentou a crise causada pela pandemia, com impacto estratosférico no setor audiovisual como um todo, somada a uma crise política e econômica, conversamos com diversos profissionais de entidades representativas do setor para falar sobre as principais necessidades do mercado para este novo governo.

Foram entrevistados Marina Rodrigues, produtora executiva com foco em políticas públicas; Leonardo Edde, sócio-fundador da Urca Filmes e presidente do SICAV (Sindicato da Indústria Audiovisual); Felipe Lopes, sócio-diretor da Vitrine Filmes e Manequim Filmes e presidente da ANDAI (Associação Nacional dos Distribuidores do Audiovisual Independente); Marcos Barros, presidente da ABRAPLEX (Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas Operadoras de Multiplex); e Gilberto Leal, presidente do Sindicato de Exibidores do Estado do Rio de Janeiro.

Os profissionais fizeram um balanço dos últimos quatro anos, falaram das principais demandas de cada segmento para este momento, bem como os principais desafios a serem enfrentados. Além de exporem suas expectativas para o Governo Lula.

Os principais apontamentos podem ser conferidos abaixo:

 

Balanço dos últimos quatro anos:

“Foi um periodo de nervosismo e muito trabalho. Acho que finalmente a gente hoje tem uma visão bem clara do que vai acontecer no mundo. O cinema volta, o cliente quer voltar, temos inúmeras provas disso, a última foi a Semana do Cinema, que foi um espetáculo. O lançamento day and date se mostrou ineficaz, não só pela pirataria, principalmente, mas também porque você deixa de aproveitar aquela pessoa que quer ir ao cinema, você perde aquele dinheiro. As pessoas querem uma experiência, elas não querem somente assistir nas suas casas. Eu vejo o streaming como era antes o DVD, o videocassete e a televisão. São incentivos para você ficar em casa, claro, mas o ser humano não foi feito para isso, assim como todo mundo tem cozinha em casa, mas os restaurantes estão cheios”, respondeu Marcos Barros. O executivo ainda ressaltou a falta de produtos para serem exibidos no cinema como uma das grandes dificuldades deste período, especialmente no pós-pandemia e enalteceu a união do mercado durante este momento de crise, algo inédito para eles nestes mais de 20 anos de carreira.

Marina Rodrigues resume estes últimos anos com: “Foi o término do que o Temer começou, que foi a venda do Brasil audiovisual para fora do país, isso além de todos os escândalos de censura, de tentar coibir o lançamento de obras. Esse governo mirou muito no ódio à classe artística, dos atores da novela das 21h, mas acertou muito nos trabalhadores que estão no entorno, que são mais humildes, são pessoas que prosperaram com a ajuda das políticas públicas”, destacou. Para a produtora executiva não há ainda a união ideal no setor, especialmente neste momento de crise, em que os players precisaram correr para se salvar.

“[Nos últimos quatro anos] o Ministério da Cultura foi extinto e a cultura como um todo – e claro, o audiovisual e por consequência a Ancine – foram sendo jogados de um Ministério para o outro. A gente passou pelo Ministério da Cidadania, chegamos ao Ministério do Turismo, sempre como uma Secretaria e com nenhuma prioridade dentro de cada um desses Ministérios. Com isso, a operação da política pública ficou totalmente prejudicada. Seja por falta de reuniões do Comitê Gestor do Fundo Setorial, seja pela falta de transferência de recursos do Governo, do caixa da União, para o Fundo Setorial. A operação toda, seja de fomento ou de regulação, ficou completamente prejudicada”, comentou Leonardo Edde, ainda sobre o período antes da pandemia. Somando à crise sanitária, ele acrescentou à morosidade nas políticas públicas que beneficiassem os produtores independentes, bem como a escassez de mão de obra, dada a alta demanda dos streamings. Tanto Marina, quanto Leonardo comentaram a atuação da Ancine, afetada pela falta de direcionamento de um ministério e com editais e incentivos paralisados.

Mas falando em Ancine, Gilberto Leal, elogia a liberação de recursos para a manutenção do parque do exibidor, mas ainda se mostra alarmado pelos acontecimentos dos últimos anos que afetaram o setor de exibição: “Uma tragédia total. Pandemia, falta de filmes, falta de público e avanço da pirataria, enfim. Um dos piores periodos para os exibidores”.

No segmento de distribuição, Felipe Lopes é taxativo: “A distribuição não possui, a nível federal, nenhuma linha de fomento exclusiva via FSA desde o Prodecine Comercialização 2018. A cota de tela não foi renovada e hoje é acentuada a diferença na competição entre o cinema independente e os blockbusters, sem uma regulação eficaz. Como vinhamos de um período de avanços e profissionalização do setor, diversas empresas sobreviveram a este período fazendo adaptações de modelos de negócio e com projetos fortes, mas é necessária uma mudança para que o audiovisual como um todo possa voltar a ter uma política de estado atuante e potente”.

 

Principais gargalos e desafios do setor no momento atual:
“Um dos gargalos continua sendo a ausência de uma política pública perene e eficaz que a gente não precise, de tempos em tempos, recuperar tudo de novo. Não faz o menor sentido a Condecine deixar de existir, que na verdade é uma contribuição de todos do setor para que a indústria brasileira se desenvolva e a indústria local se desenvolver é bom para todo mundo, é bom para a estrangeira também. A não ser para quem quer criar um oligopólio, para quem quer simplesmente que a indústria seja um setor de serviços e não uma indústria de criação de propriedade intelectual de produto de valor agregado. Quem não quer a regulação do streaming é porque quer que continuemos vendendo só commodity. Isso não é só um problema do audiovisual; é um problema da indústria brasileira, que foi escanteada historicamente. Hoje a gente segue vendendo muito commodity, mas vende muito pouco produto de valor agregado. E a gente não quer que isso aconteça no audiovisual, até porque a gente tem produtos de cabeças, nossos ativos, que são muito importantes e reconhecidos no mundo inteiro. Então nosso produto tem valor e a gente tem que reconhecer esse valor”, ressaltou Leonardo Edde.

“E produto a principal demanda agora. O parque exibidor brasileiro é moderno e atualizado. A digitalização colocou todos os cinemas mais ou menos em pé de igualdade, claro que podemos melhorar sim e vamos melhorar. Mas nos falta produtos, estamos agora com mais ou menos 35% de filmes a menos do que 2018 e 2019. Esse é o principal gargalo, o outro é que o setor saiu endividado, estamos fechando o terceiro ano da pandemia pagando a estrutura sem ter faturamento que cubra, então, o setor todo se endividou. Essa dívida precisa ser paga nos próximos anos, existe também uma necessidade de repactuação dessa dívida com o FSA”, esclareceu Marcos Barros.

Parte desse endividamento também se soma ao prazo máximo estabelecido pelo atual governo de equipar as salas de cinema com acessibilidade de conteúdo a partir de janeiro de 2023. “Mesmo com sérios problemas financeiros, temos a questão da acessibilidade que vence em janeiro de 2023, a pirataria que cada dia mais prejudica todo o setor do audiovisual e a Condecine que precisa ser continuada para que nossa indústria seja cada dia mais forte”,
acrescentou Gilberto Leal, que ainda destacou a necessidade de cota de tela, tanto para os cinemas, quanto para as outras midias.

Para Felipe Lopes, os principais gargalos do momento, especialmente no setor de distribuição são: “investimento para que possamos crescer nossas campanhas, ampliar o alcance e impressões da distribuição e ter uma melhora quantitativa na comercialização. Além disso, precisamos que haja um acompanhamento do mercado que embase uma regulação que fortaleça o setor e programas de fomento que ampliem a difusão e o acesso ao nosso audiovisual. Por fim, formação de público e capacitação profissional ainda são gargalos que vivemos.”

“Precisamos resgatar a cota de tela para a sala de cinema, precisamos ter uma união dos exibidores em torno deste tema. Temos que pensar em um modelo, além de ter uma maior validade, mas que também seja pensada por ano, estipular uma porcentagem no ano, durante as décadas de renovação. O filme brasileiro tem que ocupar a sala de cinema, isso também tira um pouco o peso das costas do exibidor, especialmente aquele independente, com poucas salas, que muitas vezes precisa optar pelo filme de maior público para não fechar. Esse é um foco muito grande que precisa ser discutido com seriedade e atenção para que isso volte a acontecer, mas precisa de união com a classe, com os exibidores. Precisamos pensar nessa classe unida, só assim vamos prosperar, com o dinheiro que vai ficar em nosso próprio pais. E aí entramos em outra necessidade que é a regulação do streaming, o setor já está convalescido e eu diria que até viciado nas plataformas de streaming. Nem julgo, acho até justo, porque a gente não teve dinheiro de outros lugares. Só que é uma salvação que é falsa, porque as pessoas continuam desempregadas. Pelo menos quando a gente tinha os mecanismos de fomento ativos, a gente podia emendar um projeto no outro. Você vai mantendo a produtividade da sua empresa, recebendo por isso e podendo contratar pessoas para ajudar, ou até expandir a empresa. Hoje a gente não tem isso, temos empresa fechando, se isso não acontece, vemos empresa saindo de um estado para o outro”, destacou Marina Rodrigues, que comentou também a necessidade de descentralização dos recursos, fazendo pulsar a produção de todos os estados e localidades, mantendo o negócio mais saudável e sustentável.

 

Expectativas para o Governo Lula:
“A gente precisa pensar nessa descentralização de verbas mesmo, que a gente consiga resgatar editais do FSA focados em outros estados brasileiros. Aí sim a gente pode ver uma cultura diversa nas telas, seja qual for. Para dar maior acesso do público ao cinema, poderia haver uma política de criação de cinema públicos, semelhantes ao da Argentina, ou seguindo o mesmo modelo da Spcine, com preços mais baixos e com filmes nacionais e estrangeiros. Acho que essa é uma política que a gente pode muito bem implementar ao redor do país, com esse governo Lula junto com a Ancine, que seja uma coisa criada e regida por eles, a abertura desses cinemas públicos. A partir disso a gente consegue resgatar o apreço do brasileiro pelo cinema, pelo audiovisual, mas também é uma chance dele assistir a um filme brasileiro que seja mais diverso. E se isso não for possível, talvez a criação de um cartão de cultura, que possibilite que as pessoas possam ver filmes, peças, shows, exposições”, afirmou Marina Rodrigues.

Felipe Lopes espera “o retorno de politicas para o segmento, já que hoje a grande maioria dos filmes não contam com apoio do governo para a distribuição. E o fortalecimento de instituições como a Ancine e o retorno do Ministério da Cultura, compreendendo o lugar estratégico que audiovisual possui para o país. Espero que ele consiga enfrentar o resultado triste para o nosso setor no Congresso e no Senado, uma vez que o presidente não governa sozinho um país”, ressaltou.

Para o setor de exibição, Gilberto Leal tem expectativa de que o governo fique em contato contínuo com os exibidores para a criação de novas formas de fomento para as salas de exibição para cada vez mais termos mais salas e mais espectadores nas salas de cinema e fortalecimento contínuo da Ancine, um grande parceiro de todo o mercado audiovisual”.

A expectativa é que mantenham a politica para o audiovisual e melhorem. Quando tem um novo governo entrando, podem ter ajustes da máquina que tomem algum tempo. Tirando isso, gente só precisa torcer para que o novo governo entenda que a gente precisa de muito apoio. Não é do dia para a noite, é um processo longo”, comentou Marcos Barros, que ainda ressaltou a importância de que haja continuidade nas iniciativas, que estas não fiquem dependentes de mudanças de governo e sejam perenes.

Por fim, para o setor de produção, Leonardo Edde destaca: “A primeira coisa, esperamos que se retome o Ministério da Cultura, porque não é simplesmente ter um Ministério, mas é dar a real importância que a cultura tem no pais. E um Ministério forte, com orçamento, com pessoas de importância dentro do governo que possam gerir a cultura dentro do pais. Porque estamos falando de muito audiovisual, mas a cultura no pais está completamente sucateada. E somos um pais que temos um ativo cultural muito forte e os países que dominam o mundo são paises que trabalham seu ativo cultural. Não é uma questão apenas de cultura, que já seria o suficiente, mas também econômica e industrial. Todos os maiores países tratam com prioridade a sua indústria, o seu setor e a sua cultura. E as demandas que a gente tem são: a retomada da cota de cinema, a prorrogação de cotas de tela de TV paga, a regulação do VOD, a implementação da Lei do Cristóvão Buarque, que define serem necessárias ao menos duas horas de cinema e audiovisual nas escolas por mês, se não em engano. A retomada da Ancine a importância da Ancine, como agência de produção independente. O que não falta é demanda”.

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